A Serpente, o Leão e o Caçador (5/5)

O Caçador (Parte 2)

[Este episódio foi produzido para ser ouvido e não apenas lido. O que se segue abaixo é a transcrição integral de toda a peça áudio.]

I

É um antigo convento. Um edifício enorme, de tijolo, com janelas gradeadas a beirar uma das ruas do centro de Madrid. Foi construído há mais de 400 anos para albergar “recogidas”, mulheres arrependidas de uma vida de pecado aos olhos da igreja. Depois, foi sede de um sindicato. E, em dezembro de 2019, aqueles corredores serviram outras lutas. Ao mesmo tempo que a Conferência das Partes das Nações Unidas, a COP25, acontecia num dos principais centros de congressos de Madrid, ativistas de mais de 900 grupos de justiça social e ambiental ergueram uma cimeira alternativa para dar voz a todos: Cumbre Social por el Clima.

Assembleias, workshops, encontros, marchas. Tudo foi organizado em Madrid em apenas quatro semanas. A COP25 e a sua alternativa deviam ter acontecido em Santiago, no Chile, mas o Presidente da República Sebastián Piñera, do partido conservador, cancelou a conferência oficial com um mês de antecedência, numa altura em que centenas de milhares de pessoas protestavam, em várias cidades, a desigualdade e austeridade no país. O governo espanhol ofereceu-se para ser o novo anfitrião. E, pelo terceiro ano consecutivo, a COP realizou-se na Europa. 

Na sala onde Tom Kucharz, ativista e jornalista, está a ser entrevistado pelo Democracy Now, há cartazes na parede. Lê-se “Plaza de los Pueblos” – a praça do povo –, “Salvemos la Tierra” – salvemos a Terra. E um outro: “Let’s Decolonize”.

Tom Kucharz (som de arquivo):
Descolonizar: essa é uma questão muito importante. Temos uma dívida histórica enorme para com milhões de pessoas que foram escravizadas, de África para a América, e nunca foi feita justiça quanto a isso. Então, a questão do anti-racismo e do anti-colonialismo é também muito importante para a marcha de hoje, às 18h. Esperamos que milhares de pessoas se reunam nesta marcha tão importante.

O protesto a exigir ação climática urgente aos líderes reunidos na COP25, que acontecia ao mesmo tempo em Santiago do Chile, juntou 500 mil pessoas nas ruas de Madrid. Ta’Kaiya Blaney era uma delas, música e ativista indígena do povo Tla’amin, natural da costa sudoeste do Canadá.

Ta’Kaiya Blaney (som de arquivo):
Como jovens indígenas, estamos na linha da frente das alterações climáticas e também na linha da frente da luta contra elas. Os direitos indígenas são imperativos à justiça climática, porque as alterações climáticas são resultado do colonialismo. Os meus antepassados foram os ativistas climáticos originais, começando pela resistência à profanação das nossas terras e águas sagradas. Por centenas de anos desde a colonização, temos estado a dizer que essa maneira, essa maneira colonial de nos relacionarmos com as nossas terras com vista à extração, sem reciprocidade, sem devolvermos nada, [essa maneira] falhou e vai levar-nos à destruição. E agora estamos no precipício do colapso global. Nós, como jovens indígenas, pedimos aos líderes globais que façam melhor. Nós sacrificamos tudo pelas nossas terras. Lutamos, morremos. Tivemos os nossos filhos tirados das nossas casas por causa destas terras. E estamos a chamar-vos para que cumpram as vossas responsabilidades.

Sinan Eden:
Quando falamos de qualquer assunto social, nós sempre pensamos em: quem são os responsáveis e quem são os afetados. No caso da crise climática, isto é ainda mais claro.
Eu sou o Sinan. Sou um ativista do Climáximo, faço tudo e mais alguma coisa como todas as pessoas envolvidas no coletivo.

Sinan Eden nasceu em Istambul, na Turquia, há 34 anos. É doutorado em Matemática e ativista no Climáximo, um coletivo sediado em Lisboa que entende a atual crise do clima como uma questão de Direitos Humanos, distribuição de riqueza e poder no mundo. “Lutamos por ideias novas e sustentáveis de bem-estar, por justiça social e resistimos a falsas soluções de ‘capitalismo verde’”, dizem no seu site. Os seus ativistas são responsáveis por iniciativas como Empregos pelo Clima e a mais recente Galp tem que cair, campanhas que promovem uma transição justa dos trabalhadores da indústria fóssil para uma economia descarbonizada.

Sinan foi também um dos coordenadores da Extinction Rebellion em Portugal. O movimento de desobediência civil não-violenta nascido no Reino Unido, no ano passado, espalhou-se por vários pontos do mundo. 

Reportagem SIC (som de arquivo):
Sentaram-se, montaram tendas e cantaram, tão alto que o barulho dos cânticos sobressaiu aos avisos das autoridades.

Numa semana, em outubro de 2019, foram detidas mais de 1100 pessoas no Reino Unido. Manifestaram-se, bloquearam estradas e invadiram sedes de gigantes industriais. Iniciaram, assim, uma nova fase na luta por ação climática urgente: uma rebelião pacífica.

Guilherme Serôdio (som de arquivo):
Para sermos ouvidos temos que bloquear a máquina o tempo suficiente para sermos ouvidos e sermos chamados para uma mesa de negociação.

Genny Scherer, ativista (som de arquivo):
Eu estou disposta a ir para a prisão por este planeta e estou disposta a ir outra e outra vez, até ver alguns resultados, até todos vermos um mundo melhor.

Sinan Eden:
Justiça climática está ligada a esta pergunta: Quem causou? Quem paga? Tu vês que, historicamente, os países do Norte Global foram os que se industrializaram mais cedo e, por isso, emitiram gases com efeito de estufa mais cedo, principalmente com carvão, depois eventualmente com petróleo e agora mais recentemente com gás.

Nas últimas décadas, as emissões globais de dióxido de carbono para a atmosfera aumentaram muito e muito rapidamente. Historicamente, os Estados Unidos da América são o país que mais contribuiu para esse aumento, responsável por um quarto das emissões acumuladas desde 1751. Segue-se a União Europeia com 22% – se considerarmos que até à saída do Reino Unido, os 28 Estados-membros assumiam compromissos climáticos em conjunto. Depois a China, 13% das emissões históricas; a Rússia; 6%, e o Japão, 4%.

Como destacam os autores de Our World In Data, um site que agrega análises a centenas de investigações científicas (e muitos dados sobre a crise climática), alguns dos principais emissores atuais – como a Índia e o Brasil – não tiveram uma grande contribuição histórica. Muito menos tiveram os países africanos, que, apesar do tamanho da sua população, contribuíram muito pouco.

Como vimos no primeiro episódio desta série, onde contamos a história da pequena tabanca guineense de Djobel, muitos destes países têm um risco desproporcionalmente maior de sofrer com a crise climática. Em parte por questões geográficas, por causa das suas características naturais.

Sinan Eden:
Mas ao mesmo tempo, existe uma coisa chamada colonialismo, que é reduzir a resiliência dos povos do Sul Global.

Margarida David Cardoso:
Em que sentido?

Sinan Eden:
Pela atividade extrativista, introduzir conceitos tecnocráticos, destruir a comunidade, introduzir instabilidade política porque rende para o negócio… Há várias formas em que, não só os países do Sul Global têm menos responsabilidade, mas ao mesmo tempo têm menos capacidade de adaptar-se neste momento.

Hoje, as responsabilidades pouco mudaram. Os países historicamente mais poluidores continuam a sê-lo. Em 2018, a China, os Estados Unidos, a Índia, a União Europeia a 28, a Rússia e o Japão foram responsáveis por 80% do consumo de combustíveis fósseis do mundo e emitiram quase 68% do total de CO2 nesse ano. Nestes países vive metade da população mundial. O que quer dizer que a outra metade do mundo – mais de 150 países – consumiu apenas 20% dos combustíveis fósseis e foi responsável por um terço das emissões. Um mundo desequilibrado, com responsabilidades desiguais. 

Seja toda a gente bem-vinda ao Fumaça. Eu sou a Margarida David Cardoso.

II

Sinan Eden, como vários ativistas e investigadores, acredita que há um processo histórico que conduziu uns países ao superdesenvolvimento e outros à superexploração. Desde o chamado período colonial, pessoas e recursos fluem do Sul para o Norte, de uma forma muitas vezes violenta: com escravatura, pilhagens, destruição de habitats, contra a vontade das populações. Basta olhar para a História portuguesa.

O padrão é ainda hoje idêntico, meio século depois da queda dos últimos impérios coloniais europeus. Em busca de recursos – sejam combustíveis fósseis ou minerais, agricultura ou pesca –, a atividade de empresas multinacionais deixa para trás ecossistemas e comunidades rurais devastadas, muitas vezes com o patrocínio ou complacência dos governos. 

E esse impacto não é compensado. As matérias-primas de países do Sul são frequentemente exportadas a baixos preços – não só o valor no mercado não reflete os verdadeiros custos da produção, nem de mão-de-obra nem de poluição, como os ganhos não chegam às populações locais.

Sinan Eden:
O melhor exemplo é a Nigéria e a Shell. Há histórias em que a Shell mata diretamente pessoas para conseguir assegurar operações.

A multinacional petrolífera dos Países Baixos, Royal Dutch Shell, tem várias batalhas judiciais pela frente na Nigéria, o país que é o maior produtor de petróleo em África. É acusada de ter sido cúmplice na execução de um grupo de nove ativistas da comunidade indígena Ogoni, uma minoria étnica do delta do Rio Níger, onde a Shell opera desde o final dos anos 50 num consórcio com a Companhia Petrolífera Nigeriana. 

Reportagem Democracy Now (som de arquivo):
O caso centra-se numa ação que acusa a gigante petrolífera (…) de cumplicidade no assassinato e tortura de ativistas nigerianos. Em 1995, nove ativistas nigerianos, incluindo Ken Saro-Wiwa, foram executados pelo governo militar nigeriano por protestar contra a exploração e desenvolvimento da Shell no Delta do Níger.

Ken Wiwa, filho de Ken Saro-Wiwa (som de arquivo):
Nós sentimos que as impressões digitais deles estão em todo o lado nas torturas, assassinatos, execuções, execuções judiciais do povo Ogoni entre 1993 e 1996.

Reportagem Al Jazeera (som de arquivo):
A Amnistia Internacional diz que as provas apontam para a cumplicidade da gigante companhia de energia Royal Dutch Shell

Mark Dummett, investigador da Amnistia Internacional:
Foram crimes horríveis, incluindo assassinato, tortura, violação e destruição de aldeias. Foram executados por membros das forças armadas nigerianas, mas os documentos internos da Shell mostram que, durante esse período, a empresa incentivou o governo militar nigeriano e a unidade militar envolvida a tomar medidas contra estes protestos, mesmo depois da empresa saber o que era provável que acontecesse.

Os ativistas que ficaram conhecidos como Ogoni Nine foram mortos em 1995 pelas autoridades nigerianas, após um julgamento desacreditado mundialmente. A petrolífera nega as acusações, mas quatro famílias das vítimas continuam a perseguir o caso em tribunal, 24 anos depois.

A Shell é ainda acusada de violações de Direitos Humanos e danos ambientais na região. Segundo um relatório de 2011 do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, poderá demorar 25 a 30 anos a limpar a poluição provocada pela exploração de petróleo no delta. O documento sublinha os impactos “desastrosos” na vegetação e identifica uma comunidade próxima de um oleoduto que bebia água de poços contaminados com benzeno, um conhecido agente cancerígeno, a níveis 900 vezes superiores aos padrões da Organização Mundial da Saúde.

Sinan Eden:
Antes, quando nós chamávamos àquilo colonialismo, era o Estado como ator económico a fazer grandes investimentos. Colonialismo era uma operação nacional. Uma operação estatal, nacional. Depois de fazer isso, eles entregaram todos estes investimentos, infraestruturas e as próprias empresas ao privado. A partir desse momento, é uma entrega de operações. Portanto, o Estado sai – isso nós muitas vezes chamamos de independência –, mas quem manda fica. Porque nenhum país entrou em nenhum outro país só porque sim. Entraram para roubar coisas. Entraram para extrair coisas. Portanto, a partir do momento que o roubo e a extração continua só que com agentes diferentes, eu não vejo grande diferença em termos do funcionamento global.

O líder político, ativista e um dos mais importantes pensadores anticolonialistas do século XX, Kwame Nkrumah, chamou-lhe “neocolonialismo, a última fase do imperialismo”. O homem que foi um dos líderes da luta pela independência do Gana e se tornou o primeiro primeiro-ministro do país nascido em África escreveu, em 1965:

Confrontado com os povos militantes dos antigos territórios coloniais na Ásia, África, Caraíbas e América Latina, o imperialismo simplesmente mudou de táctica. Sem hesitação, dispensa as suas bandeiras e, com alguma certeza, alguns dos seus mais odiados oficiais expatriados. Isto significa, assim o reivindica, que está a dar independência aos seus antigos sujeitos, a ser seguida por uma ‘ajuda’ para o seu desenvolvimento.”

“A essência do neocolonialismo é que o Estado a ele sujeito é, em teoria, independente e tem todas as aparências externas de soberania. Na realidade, o seu sistema económico e, portanto, a sua política são comandados de fora. (…) O neocolonialismo é baseado no princípio de dividir antigos grandes territórios coloniais num número de pequenos Estados inviáveis, que são incapazes de se desenvolver de forma independente e devem confiar no antigo poder imperial para defesa e até segurança interna. Os seus sistemas económico e financeiro estão ligados, como antes, aos do colonizador.”

III

Carla Amado Gomes:
Desde a Conferência do Rio, em 1992, que já os Estados das pequenas ilhas do Pacífico têm tentado – foi uma das cruzadas perdidas nessa conferência – caracterizar uma dívida histórica do Norte para com o Sul. Nunca se quis aceitar isso. A Austrália, os Estados Unidos, nada de dívida história. ‘Nós ajudamo-vos imenso. Colonizamo-vos. E ajudamos ao desenvolvimento.’ Enfim, de uma determinada perspetiva. E, portanto, nunca se aceitou essa ideia da dívida histórica.

Uma dívida ecológica histórica. Carla Amado Gomes, professora na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, é especialista em Direito Ambiental. Publicou quase 30 livros e algumas dezenas de artigos científicos. É uma daquelas pessoas que, todos os anos, dedica especial atenção às duas semanas em que os líderes mundiais se reúnem na COP, a Conferência das Partes das Nações Unidas dedicada ao clima.

Esta ideia de dívida histórica de que fala nasceu da constatação de que os custos de um modo de vida insustentável são suportados por aqueles que menos contribuíram para eles.

Carla Amado Gomes:
Isso voltou com o acordo de Paris e voltou-se a falar da dívida, nomeadamente em questões de responsabilidade por mecanismos de causa efeito dos estados desenvolvidos face aos estados menos desenvolvidos e, nomeadamente face aos estados insulares. Isso não foi aceite.

Esta dívida reflete um desequilíbrio histórico. Num artigo com o título “Nós, os povos do Sul, somos os credores ecológicos”, publicado em 2003, três organizações não governamentais latino americanas definiram a dívida ecológica como – e estou a citar – “a dívida acumulada, histórica e atual, que os países industrializados do Norte, as suas instituições e corporações devem aos povos e países do Sul.”

Na prática, falam, entre outras questões, de uma dívida por causa de pilhagem de riquezas, da transformação de pessoas em escravos e de recursos naturais em mercadorias durante o chamado período colonial; por causa das consequências negativas da extração de recursos; por causa da degradação ambiental provocada pelo cultivo de monoculturas; por causa da poluição da atmosfera e da consequente apropriação da capacidade de florestas e oceanos absorverem CO2.

As bases desta ideia de dívida ecológica remontam ao início dos anos 60, quando os novos Estados independentes da Ásia e da África e os países da América Latina começaram a questionar a legitimidade do direito internacional em matéria de recursos naturais e ambiente. Muitas normas pareciam servir apenas os interesses de nações ocidentais e não refletiam as aspirações dos países em desenvolvimento. Com a sua participação, nessa década de 60, foram criadas a proteção internacional dos Direitos Humanos e o direito internacional referente à soberania de cada nação sobre os seus recursos naturais.

Em 1972, em Estocolmo, naquela primeira Conferência da Terra que revisitamos no episódio anterior, o biólogo norteamericano e professor universitário Barry Commoner falava de uma reparação ecológica. 

Barry Commoner (som de arquivo):
Eu penso que os países em desenvolvimento começaram a perceber que têm sido vitimizados ecologicamente, por assim dizer, pelo colonialismo. Que a explosão populacional é um efeito, a última remanescência da influência danosa dos colonizadores nas colónias. E a proposta, que acredito que será apresentada, aqui, na conferência oficial, para reparações ecológicas, acho que é uma ideia justa que os países em desenvolvimento estão a apresentar. Acho que reflete muito claramente o entendimento da base ecológica das suas dificuldades.

No entanto, em 1972 não se decidiu qualquer tipo de reparação. Foi nos anos 90 que surgiram as primeiras discussões que definiram o conceito de dívida ecológica. Surgiram entre ambientalistas na América Latina, impulsionados pelas publicações de dois ativistas da ONG chilena Instituto de Ecologia Política.

O conceito chegou à Cimeira da Terra do Rio de Janeiro, em 1992, com a proposta de ONG e grupos de cidadãos de criar um Tratado da Dívida. Falava da dívida ecológica em oposição à dívida financeira externa, que asfixiava países em desenvolvimento. Propunham uma outra forma de olhar para as finanças.

Gostava de vos mostrar áudios da época, para que fossem os próprios autores a explicar o que aconteceu. Mas depois de horas de pesquisa em arquivos, não consegui encontrar nada – como se esta ideia se tivesse diluído no tempo.

IV

O que é que acontece, então, quando o antigo colonizador e o colonizado se sentam à mesma mesa numa conferência do clima? Para que lado pende a balança quando se discute até onde vamos deixar que o clima mude? Quem decide que terras e que vidas aceitamos sacrificar? Voltamos às COP.

Lembram-se do Protocolo de Quioto, aquele documento que imponha metas aos países industrializados – o único até à data com força de lei? O mesmo que, antes de entrar em vigor, se viu praticamente inviabilizado com o abandono dos Estados Unidos, à data o maior emissor de CO2.

Como vimos no último episódio, durante o período em que vigorou, 2008 a 2012, o protocolo surtiu efeito nos poucos países que concordaram em fixar metas. Foi cumprido pela maioria dos países europeus e pela Rússia. Mas as emissões globais nunca pararam de aumentar. Em especial, na China, na Índia e em outras economias emergentes, às quais o protocolo de Quioto não impôs metas. Apenas os países industrializados tinham que assumir esse compromisso. 

Sinan Eden fala num efeito perverso do Protocolo de Quioto.

Sinan Eden:
O resultado disto é que as empresas migraram para sítios onde não havia este tipo de quotas. E isso acontece exatamente porque ninguém está a controlar e planificar a economia. Tu dizes ‘quero que isso aconteça’ e depois deixas o mercado fazer. E o mercado, em vez de olhar para o problema, olha para o lucro, olha para o dinheiro e acaba por priorizar o dinheiro e o mesmo tempo tentar encontrar loopholes no regulamento que montaste. Portanto, grande parte da migração das indústrias pesadas poluidoras aconteceu por causa do Protocolo de Quioto.

Nas últimas décadas, em especial desde os anos 70, a Europa e a América do Norte têm passado por uma desindustrialização. Atrás de menores custos de produção, entre os quais mão-de-obra mais barata e padrões de proteção ambiental menos exigentes, a indústria transformadora e grandes fileiras poluidoras foram exportadas para os países do Sul. Onde é mais barato produzir.

Só na União Europeia, entre 2008 e 2014, perderam-se 3,5 milhões de postos de trabalho na indústria transformadora.

Com isto, foram exportados também os custos ambientais destas indústrias, a sua poluição e gases com efeito de estufa. Ao mesmo tempo, nos países ocidentais de onde estas fábricas saíram, os padrões de consumo não se alteraram. Continuaram a consumir-se os mesmos produtos, agora feitos do outro lado do planeta. O que significa que às emissões associadas à produção, se somou a pegada ecológica dessa viagem. No entanto, ao final do dia, esses custos ambientais não estão incluídos no preço que pagamos pelos produtos.

Foi também em Quioto que se criaram aquilo a que hoje chamamos mercados de carbono. O documento foi – e estou a citar – “o primeiro acordo internacional a reconhecer o potencial de utilização da economia de mercado como instrumento para ajudar à concretização das metas acordadas”, resume a Agência Portuguesa do Ambiente, no seu site. O presidente norteamericano Bill Clinton não diria melhor.

Bill Clinton (som de arquivo):
Estou particularmente satisfeito por o acordo refletir fortemente o compromisso dos Estados Unidos de usar as ferramentas do mercado livre para enfrentar este problema.

Após longas negociações, o Protocolo de Quioto veio permitir aos países industrializados que se comprometeram com metas comprar direitos de emissão adicionais. Foi criado um complexo comércio internacional de créditos de carbono em que um país cujas emissões estão abaixo daquilo que lhe é permitido pode vender os excedentes a outro que tenha ultrapassado o seu limite. 

Com o Protocolo de Quioto, foi também criado um mecanismo que permite às empresas e Estados dos países do Norte diminuir virtualmente as suas emissões, financiando projetos que reduzam a emissão ou aumentem a absorção de gases com efeito estufa nos países do Sul. Ou seja, é permitido aos países do Norte e às suas indústrias continuar a poluir nos seus territórios, desde que financiem, por exemplo, fontes de energia renováveis ou projetos de florestação no outro lado do planeta.

Em maio de 2019, uma investigação da ProPública, uma redação independente sediada em Nova Iorque, com o título “An (even more) inconvenient truth” – Uma verdade (ainda mais) inconveniente – mostrou como muitos créditos de carbono para preservação da floresta não cumprem esse objetivo. A jornalista Lisa Song, depois de analisar projetos, juntar resultados de vários relatórios, falar com investigadores e até contratar uma empresa de análise de imagens de satélite, percebeu que, caso atrás de caso, os créditos de carbono não compensaram a quantidade de emissões que deveriam, ou essa compensação dura pouco tempo ou os seus ganhos nem sequer podem ser medidos com precisão. Ela concluiu que – e estou citar – “os poluidores obtiveram um passe livre de culpa para continuar a emitir CO2, mas a preservação da floresta que deveria equilibrar as contas nunca chegou ou não durou”.

V

Um dos pontos mais centrais das conferências do clima ao longo dos anos foi a definição de um limite máximo para o aumento da temperatura na atmosfera. O que implica responder às perguntas: até onde aceitamos que o planeta aqueça? Que consequências estamos dispostos a suportar? E há duas décadas que a meta dos 2ºC em relação ao período pré-industrial é o alvo da política climática global.

As primeiras referências a este limite surgiram em 1990. Com base no conhecimento à época, o Instituto de Ambiente de Estocolmo, um centro de investigação sem fins lucrativos que procura soluções de desenvolvimento sustentável, sugeriu que 2ºC era o aumento máximo que se poderia atingir para evitar os piores impactos da crise climática. Segundo o relatório divulgado em 1990, esse não é sequer um limite confortável. Qualquer aumento acima de 1ºC – e estou a citar –, “pode gerar respostas rápidas, imprevisíveis e não lineares que podem levar a danos extensos nos ecossistemas”. 

Seis anos depois, em 1996, o Conselho de Ambiente da União Europeia, onde se sentam os ministros do ambiente dos Estados-membros, concordou com esse limite. E nos 25 anos que se seguiram ao relatório, a maior parte dos países do Norte manteve-se firme, pelo menos teoricamente, a essa recomendação.

Para muitas regiões do planeta, atingir este limite significa que eventos extremos serão muito mais frequentes e severos. Como a temperatura não muda à mesma velocidade em todo o lado, segundo o Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas, o organismo das Nações Unidas que reúne alguns dos principais cientistas climáticos, mais de um quinto da população mundial vive em regiões que já experimentaram, pelo menos um vez no ano, um aumento superior a 1,5°C em relação aos níveis pré-industriais. Isto sente-se particularmente no Ártico, na estação fria, e nas regiões de média latitude, na estação quente. 

Chegar aos 2ºC significará amplificar as consequências que já sentimos: ondas de calor extremo, inundações e secas. Tudo será mais extremo e severo, aumentando o risco de pobreza para centenas de milhões de pessoas e uma vaga de refugiados sem precedentes. A diferença de meio grau é particularmente crítica para os pequenos estados insulares e zonas de baixa altitude – como o Kiribati e a Guiné-Bissau, mas também o Tuvalu, as Ilhas Marshall ou as Filipinas –, ameaçados com uma subida do nível médio do mar, dizem as projeções, de mais de dois metros. 

Reportagem Associated Press (som de arquivo):
Tinha todos os detalhes de um conselho de ministros formal, à exceção de estarem seis metros debaixo de água e a usar equipamento de mergulho. O presidente das ilhas Maldivas e outros 13 ministros sentaram-se a uma mesa no fundo do mar, sob a superfície de uma lagoa.

Reportagem Sky News (som de arquivo):
…para consciencializar o quão vulneráveis são as Maldivas às alterações climáticas.

Mohamed Nasheed, presidente das Maldivas:
Se as Maldivas não puderem ser salvas hoje, não sentimos que haja muitas oportunidades para o resto do mundo.

Reportagem Sky News:
Hoje, os ministros assinaram um documento pedindo a todos os países que reduzam as suas emissões de carbono. Isto acontece antes de uma importante conferência da ONU sobre alterações climáticas, em Copenhaga, em dezembro.

Reportagem Al Jazeera (som de arquivo):
Se esse acordo não for alcançado, o presidente diz que os futuros conselhos de ministros serão todos subaquáticos.

No entanto, na COP de Copenhaga, em 2009, dois meses depois, oito das maiores economias do mundo reunidas no G8 – Canadá, França, Alemanha, Itália, Japão, Rússia, Reino Unido e Estados Unidos, com a União Europeia a assistir – concordaram que o limite de 2ºC seria uma mudança aceitável. 

Também uma aliança de centenas de organizações da sociedade civil, que incluía gigantes ambientalistas como a World Wildlife Fund, a Oxfam Internacional, a Avaaz e a Greenpeace, pediu que os chefes de Estado chegassem a um acordo que apontasse para um limite máximo de 2ºC. 

No momento em que se estava mais uma vez a concordar com esse limite, na Conferência de Copenhaga, em 2009, Lumumba Di-Aping, diplomata sudanês e o principal negociador da coligação de países em desenvolvimento, o G77, deu uma conferência de imprensa para vários representantes destas ONG. Isto foi o que ele disse.

Lumumba Di-Aping (som de arquivo):
Quem articulou a perspectiva e nos tentou convencer de que os 2ºC são uma escolha razoável fez uma escolha entre a vida, a humanidade e a busca do lucro. Não tem base na Ciência. Vou dizer isto e vou dizê-lo com absoluta convicção: 2ºC são a morte certa para África. São a devastação certa dos Estados insulares.

Chegados à COP de Paris, em 2015, o limite de 2ºC já tinha sido formalmente consagrado na política climática internacional, através de um acordo assinado em Cancún cinco anos antes. A Aliança dos Pequenos Estados Insulares decidiu, então, adotar o slogan 1,5 to Stay Alive – 1,5 para continuar vivo –, ilustrando como um aumento superior da temperatura é uma sentença de morte. 

Este é o representante das Maldivas, falando em nome da aliança.

Representante das Maldivas na COP25 (som de arquivo):
A chamada barreira de proteção de 2ºC está longe de ser segura e, por isso, é completamente inadequada. A análise deixa claro que precisamos de ampliar e implantar soluções necessárias para atingir a meta de temperatura global abaixo de 1,5ºC. Temos que fazer isto agora.

Aqui, Giza Gaspar-Martins, representante de Angola e presidente do bloco dos Países Menos Desenvolvidos.

Giza Gaspar-Martins (som de arquivo):
Senhor Presidente, instamos as partes, todas as partes, a lembrarem-se de que mais de 100 de nós acreditam que a meta de 2ºC é inadequada e deve ser fortalecida para ficar abaixo de 1,5ºC. Visar atingir uma meta de 2ºC não é uma opção segura para a maioria dos nossos países.

O físico Filipe Duarte Santos, que se dedica ao estudo das alterações climáticas desde os anos 80, estava lá também, na COP de Paris.

Filipe Duarte Santos:
Esses países, pequenos estados insulares, coligaram-se na conferência de Paris. Disseram: “Não, não podemos apontar para dois graus porque se ultrapassarmos um grau e meio nós já estaremos numa situação gravíssima. Bom, e como as decisões têm que ser tomadas por unanimidade criou-se um impasse. Aquilo foi, de certo modo, inesperado e muito perturbante, porque podia inviabilizar chegar a um acordo. 
O impasse resolveu-se através de uma menção no texto final da resolução, em que dizia que vamos apontar para dois graus, mas vamos fazer todos os esforços possíveis para que seja apenas de 1,5ºC.

Filipe Duarte Santos publicou em 1987 com, o na altura aluno, Ricardo Aguiar o primeiro artigo científico a equacionar os possíveis efeitos das alterações climáticas em Portugal. Participou em várias conferências do clima e foi revisor do quinto relatório do Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas, o IPCC.

Foi precisamente essa organização científico-política das Nações Unidas que foi mandatada pelo Acordo de Paris para estudar, por fim, quais as “vantagens” de limitar o aquecimento global a 1,5ºC e não 2ºC.

O relatório, publicado em 2018, foi muito claro: meio grau de diferença pode reduzir os riscos e impactos de eventos extremos. Pode ainda impedir que os recifes de coral sejam completamente erradicados e aliviar a pressão no Ártico. Mas, para isso, são necessárias mudanças urgentes e sem precedentes – ainda assim totalmente exequíveis, afirmaram os autores do relatório.

Quando foi apresentado na COP de 2018, em Katowice, na Polónia, alguns líderes mundiais pareceram não querer ouvir aquilo que eles próprios pediram que se estudasse.

Filipe Duarte Santos:
E surpreendentemente o relatório não foi ‘welcomed’. 

Uma coligação de países, composta pelos Estados Unidos, Rússia, Arábia Saudita e  Kuwait, todos exportadores de petróleo, opuseram-se a que a assembleia endossasse o relatório. Apenas ficou expresso no documento final da COP que os países tomam nota de o ter recebido.

Filipe Duarte Santos:
Tomam nota… a conferência apenas tomou nota. Assim como se toma nota que foi publicado um livro, não é? É como se não dissesse nada que interessasse.

Mas a crua realidade por detrás disso é que mesmo que os países cumprissem escrupulosamente os compromissos individuais que verteram no Acordo de Paris, a temperatura iria aumentar muito além dos 2ºC. Três quartos das promessas são “totalmente inadequadas”, insuficientes, segundo uma análise publicada em novembro de 2019, feita por cinco destacados cientistas climáticos, entre eles Robert Watson, antigo presidente do IPCC. 

O estudo concluiu que grandes produtores de petróleo, como a Rússia, Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos e Kuwait nem sequer estabeleceram metas para reduzir emissões. Os Estados Unidos e o Brasil estão longe dos seus objetivos. Entre os países do Norte, só os 27 da União Europeia, o Reino Unido, a Noruega, a Suíça e a Ucrânia, entre outros, parecem estar no caminho certo.

Filipe Duarte Santos:
As perspetivas que temos atualmente de cumprir aquilo que foi concluído com o Acordo de Paris são muito ténues. É muito pouco provável que o aumento da temperatura se fique pelos 2ºC, é muito mais provável que se fique por valores superiores: 3ºC ou mais do que 3ºC. E portanto, isto não são boas notícias. E não são boas notícias, sobretudo, para os países e populações que são mais vulneráveis.

Quem sofre mais num mundo 2ºC mais quente são os mesmos de sempre. E na hora de os compensar, COP atrás de COP, as mesmas antigas feridas dividem 190 nações. 

Filipe Duarte Santos:
Então esses países começaram a falar de que a solução para isso seria que os países com economias mais avançadas e os países que não fossem tão vulneráveis teriam que compensar financeiramente esses países que iriam até, alguns deles, desaparecer. Mas isso é uma expressão que os países rejeitam. Em particular os Estados Unidos, rejeitam ouvir falar de se pagar o que quer que seja para a adaptação ou para a relocalização das populações que teriam que sair daquelas ilhas para outros sítios.

De volta a Carla Amado Gomes, especialista em Direito Ambiental.

Carla Amado Gomes:
O mais próximo que se chegou foi a um mecanismo – que agora voltou a falar-se mas para nada, porque não avançou nada – que é a ideia do loss and damage, da perda e da compensação.

Este foi um dos pontos centrais de discussão na COP 25, a última, em Madrid, em dezembro de 2019. Foi negociado o apoio financeiro destinado à reparação dos impactos inevitáveis e irreversíveis da crise climática, nos locais onde a mitigação falhou e a adaptação não é possível. Criado em 2013, o chamado Mecanismo Internacional de Perdas e Danos de Varsóvia não está ainda totalmente operacional. O seu comitê executivo, que se deve reunir pelo menos duas vezes por ano, é aconselhado por quatro grupos de trabalho especializados. 

Carla Amado Gomes:
E a ideia do loss and damage tem a ver com o mecanismo de Varsóvia e que supostamente há uma task force a pensar desde a COP de Paris em que como é que nós vamos implementar isto – portanto, desde 2016 que andamos a pensar nisto mas ainda não se fez nada. A ideia é… eu não sei qual é a ideia exatamente porque ela ainda não foi concretizada, mas a sensação que me dá é que vai-se constituir uma espécie de um fundo,… mas há um fundo específico que vai ajudar às perdas e danos ocorridas em face de fenómenos extremos, nomeadamente até em face de perda de território, por parte desses estados insulares. Só que isso não é diretamente imputado a nenhum Estado ou conjunto de Estados, é diluído num fundo, precisamente para se perder aquela ideia da causa-efeito e da responsabilidade.

Ao fim de duas semanas de negociações e na vertigem de duas noites sem dormir, a COP de Madrid terminou sem que os líderes mundiais chegassem a acordo sobre quem deverá governar este fundo. 

O acordo que saiu da capital espanhola delegava apenas responsabilidade num fundo já existente, que tem outro objetivo que não o financiamento de perdas e danos. Trata-se do Fundo Verde para o Clima, operacional desde 2014 e através do qual os países mais desenvolvidos se comprometeram a canalizar 100 mil milhões de dólares por ano, até 2020, para os países mais pobres. Este valor deve servir para financiar projetos que reduzam as emissões e melhorem a capacidade destes países responder aos eventos climáticos. O que os líderes mundiais acordaram em Madrid é que este fundo também se deve encarregar de dispensar dinheiro para mitigar perdas e danos.

Carla Amado Gomes:
Isso pode ser um mecanismo. Aí estaremos seguramente sempre a pensar num mecanismo assistencial. Há situações em que os territórios vão mesmo desaparecer e, se calhar ao longo dos milhares e milhares e milhares de anos de vida do planeta isto já aconteceu, já houve muitas migrações, já foi territórios desocupados que passaram a ser ocupados e vice-versa (…) com uma agravante é que nessa altura deve ter sido uma coisa natural, por força de alterações morfológicas do planeta, hoje é uma questão ética. Hoje sabemos que se continuarmos na trajetória em que vamos vai haver comunidades extraordinariamente afetadas, em última análise vamos todos ser afetados. Portanto, esta é uma questão jurídica, mas também é uma questão ética.

Para os países em desenvolvimento, a ajuda financeira é vista como uma compensação justa pela pilhagem dos seus recursos naturais por parte dos colonizadores ocidentais, que destruíram habitats naturais, levaram espécies invasoras para locais onde estas não existiam e iniciaram uma lógica comercial que fez sucumbir milhões de pessoas à força das nações mais desenvolvidas. Mas para os representantes de vários países ocidentais, estes argumentos são, na verdade, uma forma de extorquir mais dinheiro e fugir à responsabilidade de se desenvolverem, sim, mas de forma sustentável.

Carla Amado Gomes:
A solução só pode ser uma e é relativamente banal: é ajuda ao desenvolvimento. Nós não podemos acolher essas pessoas na Europa, não temos espaço, não temos cultura similar, não temos clima com que elas possam conviver relativamente aos meios onde vivem. Portanto, o que nós devíamos ter feito era bons processos de descolonização, respeito por aquelas novas identidades e ajuda ao desenvolvimento, para que elas ficam lá muito bem, porque elas são dali, elas não querem sair dali, são os seus territórios. Elas não querem nada vir para a Europa. Elas vêm para a Europa porque fogem da morte. A Europa, e não só, tem uma responsabilidade histórica pela ajuda ao desenvolvimento e isso poderia e poderá eventualmente jogar a seu favor que é impedindo a fuga.

Sinan Eden:
Eu não sei como é que isso podia ser feito. Em primeiro lugar, isso não podia ser feito por pessoas do Norte Global. Mas nós precisamos de fazer uma série de coisas que é deixar de dar legitimidade às empresas que estão a fazer essas operações e esse negócio no Sul Global. Nós temos poder aqui para bloquear e criar disrupção nas operações sejam económicas sejam deliberativas destas empresas e dizer ‘Nós não queremos que isso aconteça’. Deixar de estragar é o nosso dever. Deixar de matar é o nosso dever.

Carla Amado Gomes:
Agora, neste momento, parece-me muito difícil evitar o caos que se avizinha porque todos os modelos apontam para uma África, pelo menos na sua parte central, dos trópicos, altamente desertificada nos próximos 10/20 anos. 
Isto devia ter sido pensado antes. Agora é correr atrás do prejuízo e estar neste impasse de não saber o que fazer às pessoas. E deixá-las morrer, em última análise.

48 anos depois da conferência de Estocolmo, quase tudo mudou na forma como políticos e decisores falam sobre a crise climática. Mas pouco parece ser diferente na hora em que são chamados a agir. 48 anos depois de Estocolmo, mantém-se as mesmas conclusões e os mesmos entraves. As emissões globais de gases com efeito de estufa continuam a aumentar. Mantêm-se antigos e emergem novos poluidores. A economia global continua inclinada. 

Há greves estudantis e mobilização cidadã nas ruas como nunca antes. E o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, alinha a sua voz com a de quem protesta a inação dos governos, que mantêm as mesmas conclusões, os mesmos entraves.

Só uma coisa é realmente diferente: a urgência de combater a crise climática.

Sinan Eden:
As instituições estão a falhar. Estão montadas para falhar. Estão desenhadas de certa forma que produzem lucro e não um planeta habitável ou nada disso. Isso tem duas implicações: em primeiro lugar, isso é muito assustador, porque de repente percebe-se que não há um Super Homem, não há um Homem Aranha para nos salvar. Não há. Essas pessoas não existem. Em segundo lugar, então, nós temos que chegar à frente e lutar para vencer mesmo, não é lutar para influenciar uma ou outra pessoa. Não. É vencer nós, o povo.

Jolein Holtz, investigadora, representante das organizações não-governamentais de Mulheres e Género na COP25 (som de arquivo):
Poder popular! Justiça climática!

Zuzanna Borowska, ativista do Polish Ecological Club, uma das representantes das organizações não-governamentais juvenis na COP25 (som de arquivo):
Nós estamos a erguer-nos. Estamos a lutar. E vamos vencer. As COP falhou para com as pessoas e o planeta. Poder popular! Justiça climática!

Francis Stuart, sindicalista do Scottish Trades Union Congress, representante das organizações sindicais na COP25 (som de arquivo):
Esta COP falhou para com as pessoas e o planeta. Poder popular! Justiça climática!

Adam Currie, ativista climático, representante das organizações não-governamentais de Ambiente na COP25 (som de arquivo):
Esta COP falhou para com as pessoas e o planeta. Poder popular! Justiça climática!

Kera Sherwood O’Regan, ativista da comunidade Kāi Tahu (Nova Zelândia), representante das organizações indígenas na COP25 (som de arquivo):
…. porque poder popular é justiça climática.

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